livrosnlidos.jpgExistem livros que estão à minha espera na estante...

...ou até mesmo já passaram por várias estantes sendo arrumados, classificados, limpos, mas nunca lidos. Travo com eles uma batalha de resistência. Eles me olhando e eu respondendo: ainda não é o tempo, aguardem. Chegará o dia. Vejam que já dei o primeiro passo trazendo vocês para casa etc etc etc.

Tenho um aqui que comprei em 1997. Li a introdução, o primeiro capítulo e resolvi parar. De lá para cá, casei, morei em quatro casas diferentes, vi dois filhos nascerem e o livro Deus, uma Biografia encontra-se praticamente intocado, como no primeiro dia da criação.

Posso citar outros: a biografia do Lewis Carrol (o autor passa mais da metade das 640 páginas tentando sustentar a teoria que o escritor inglês não era pedófilo e sim buscava a inocência pagã, idílica, bucólica, primitiva ou seja lá o que for, em fotografar crianças nobres inglesas da maneira como elas vieram ao mundo. Oquuueiiiiiii.....), a coletânea Contos – Os Clássicos, composta de três volumes: Contos Ingleses, Contos Americanos e Contos Russos, dos quais só completei o primeiro que é excelente. E até mesmo o Criatividade e Grupos Criativos, com o qual não consigo manter uma relação linear...corro para capítulos lá na frente, leio pequenos trechos, volto para a introdução...uma hipérbole ou uma homenagem à imensa Linha Curva a qual todos devemos ser devotados...(se não entendeu leia a introdução do livro em sua livraria preferida).

Nada condenável ao meu ver: os livros é que nos escolhem. Somos prateleiras que vão e vem.

foer_capa.jpgPor outro lado, existem livros como o Extremamente Alto & Incrivelmente Perto, do Jonathan Safran Foer...

...que passam com louvor do que chamo de teste das orelhas e primeira página. Como isso acontece? Já citei em outros posts que meu passatempo predileto é dar uma volta pelas livrarias aqui do Rio na hora do almoço, algumas vezes substituindo até mesmo um P.F. sem sal por boa literatura, croassaint e café expresso. Ajuda a refrescar as idéias, conhecer novos autores e, até mesmo, comprar uma ou outra coisinha. Nessas andanças, mês passado, deparei com o segundo livro do Foer (que é autor também do Tudo se ilumina, que já estive para comprar mas desisti, vejam só como são as coisas...). A capa me impressionou, parecia querer dizer alguma coisa. Então resolvi aplicar o teste que falei. Como primeiro passo, abri a orelha esquerda:


Foer_orelha.JPG

Caramba...parece meu filho do meio! Como não querer conhecer melhor Oskar? E foi ele mesmo que me respondeu, com sua peculiar maneira de enxergar o mundo, num primeiro parágrafo encantador (clique para ampliar):



Ri sozinho na livraria por 5 minutos. Pedi mais um café, li todo o primeiro capítulo e fiquei tão atônito que lembrei de pagar a conta da cafeteria só na caixa, quando adquiria o livro para lê-lo em cinco dias de leitura ininterrupta. Cama, ônibus, fila de banco...devorei.

Mas o que faz o Extremamente Alto & Incrivelmente Perto ser tão peculiar?

Primeiro: não se rende à fórmula fácil do 11 de Setembro, como os filmes e livros que temos visto por aí. Oskar é um órfão do “dia mais triste de todos os tempos”. Seu pai desabou com as torres e com ele os arquétipos de um menino que não consegue parar de inventar coisas como camisas de alpiste para que os pássaros façam você voar, auto-falantes conectados aos corações das pessoas para que todos possam ouvir os batimentos uns dos outros, bolsos portáteis, limusines tão grandes que saiam dos úteros das mães diretos para o cemitério, cobrindo assim, sua vida toda. Oskar é um menino que sente demais, que quando triste "fecha o zíper de seu saco de dormim de mim mesmo", é inventor e manda cartas para grandes personalidades oferecendo-se como assistente...enfim. Ele “herda” apenas uma chave dentro de um envelope marcado com a palavra “Black” e, perambulando seis meses por um Nova York insuspeitamente acolhedora e amigável, dois anos após a morte de seu pai, resolve conhecer todos os cidadãos com este sobrenome. Louco? Não. Lógico.

Segundo: tem tramas paralelas cercadas de soluções formais interessantíssimas. São intervenções fotográficas, rasuras, as mãos do avô – meu personagem preferido em todo o livro e segundo minha leitura o elemento central, aquele que vem resgatar tudo e todos e redimir-se do passado amedrontado de quem igualmente “sente demais”-, o universo da avó, tão devotado a um amor sem palavras, limite ou barreiras, sem super-egos aparentes.

Terceiro: não é piegas. E nos mostra uma infância em que já se sabe de muita coisa. Uma infância que sobrevive ao terror com lições de inocência. Algumas lições que vamos esquecer com o tempo, a medida que crescemos.

Resumindo em três palavras: crescer é desaprender.

Leitura fundamental. Da primeira a última página.

Lins úteis.

Cliques importantes sobre o autor e sua obra:

E sobre os livros citados no post:

Depois me digam se gostaram, ok?